10/01/2016

Lendo Os Miseráveis #1




Olá pessoas, tudo bem com vocês? :)

Hoje iremos conversar um pouco sobre o livro "Os Miseráveis", do Victor Hugo. Estou participando da leitura coletiva promovida pelo canal Livro & Café e Subindo no Telhado e se você quiser se juntar conosco nessa missão, poderá ter mais informações clicando aqui.

Nessa primeira semana li até a página 158 (Tomo I Fantine, livros 1º e 2º), seguindo o cronograma de leitura sugerido pelos blogs acima. A ideia é ler cerca de 150 páginas por semana.

"Enquanto, por efeito de leis e costumes, houver proscrição social,
forçando a existência, em plena civilização, de verdadeiros infernos,
e desvirtuando, por humana fatalidade, um destino por natureza
divino; enquanto os três problemas do século - a degradação do
homem pelo proletariado, a prostituição da mulher pela fome,
e a atrofia da criança pela ignorância - não forem resolvidos;
enquanto houver lugares onde seja possível a asfixia social; em
outras palavras, e de um ponto de vista mais amplo ainda, enquanto
sobre a terra houver ignorância e miséria, livros como este não
serão inúteis".
(Victor Hugo - 1862)

Inicialmente, antes de conversar sobre o que achei da leitura dessa primeira semana, queria contextualizar um pouco o cenário da França no final do século XVIII e início do século XIX, onde a história se passa, relembrar as nossas aulas de História. 

A França, até o século XVIII, vivia sob um regime de monarquia absolutista e a sociedade estava divida em estamentos ou estados. O primeiro estamento pertencia ao clero, o segundo estamento pertencia à nobreza e o terceiro, ao resto da população. Os direitos eram vistos de acordo com o estamento no qual a pessoa estava incluída e, claro, ao primeiro e ao segundo eram conferidos vários privilégios em detrimento do terceiro. Ainda sim, os dois primeiros estamentos não possuíam nenhum dever de manter os tesouros da Nação, ou seja, os impostos recaíam apenas ao restante da população. E esta vivia na mais completa miséria. E apesar disso, a desigualdade era vista como a ordem natural das coisas, a vontade de Deus.

A Revolução Francesa (1789-1799) foi uma série de acontecimentos que visavam acabar com as regalias do clero e da nobreza e instituir um regime onde todos fossem iguais perante a lei. No entanto, apesar de trazer a igualdade formal, as pessoas mais humildes nos pós-revolução continuaram privadas dos seus direitos mais básicos, como alimentação e moradia. Hannah Arendt, em seu livro "Sobre a Revolução" retrata com muita propriedade o legado da Revolução Francesa para o mundo e, principalmente, para a França. Abaixo, transcrevo alguns trechos de seu livro para que possamos entender a situação da França pós revolução:

"A história constitucional da França, onde mesmo durante a revolução seguiu-se uma Constituição após a outra, enquanto os homens que estavam no poder não conseguiam colocar em vigor nenhuma das leis e decretos revolucionários, pode ser facilmente lida como um registro monótono ilustrando reiteradamente o que devia ter sido óbvio desde o início, a saber, que a chamada vontade de uma multidão (se for mais do que uma ficção jurídica) é por definição sempre variável, e que uma estrutura fundada sobre ela está fundada sobre areia movediça. O que salvou o Estado nacional da ruína e queda imediata foi a facilidade extraordinária com que se podia manipular e impor a vontade nacional sempre que alguém se dispusesse a tomar a si o fardo ou a glória da ditadura" (p. 215)
"Mas tal transformação não foi possível nos países afetados pela Revolução Francesa. Nessa escola, os revolucionários aprenderam que os antigos princípios inspiradores tinham sido invalidados pelas forças nuas e cruas da escassez e da necessidade, e concluíram o aprendizado plenamente convictos de que foi a própria revolução que revelou o que de fato seriam esses princípios - um monte de asneiras. Denunciar essas 'asneiras' como preconceitos pequeno-burgueses lhes era muito mais fácil porque a sociedade havia realmente monopolizado esses princípios, desvirtuando-os e convertendo-os em 'valores' (...). também teria de admitir que nenhuma revolução, nenhuma fundação de um novo corpo político, seria possível onde as massas eram oprimidas pela miséria." (p. 281-282)
Aqui não quero desmerecer a Revolução Francesa, que sem dúvida alguma, foi um marco para o ocidente e, principalmente, para a própria Franca. Porém, é certo que uma monarquia absolutista foi derrotada e, em seu lugar, implantada uma "ditadura Napoleônica". Ou seja, só ouve uma mudança na classe dominante, antes o clero e a nobreza, agora a alta burguesia. Enquanto isso, a miséria continuava...

Os Miseráveis, de Victor Hugo
Ed. Cosac Naify
Os Miseráveis se inicia em 1815, após a Batalha de Waterloo. Em alguns trechos, ainda são narrados acontecimentos do Governo dos Cem Dias de Napoleão, quando ele fugiu da Ilha de Elba, em março de 1815, e voltou para a França.

A história é narrada em terceira pessoa, por um narrador onisciente, que tudo sabe e que tudo vê, mas que nem tudo conta para a gente. Sim, a impressão que tive é que o narrador brinca com o leitor em alguns momentos. Ele não é todo isento de opinião e nos induz a pensamentos. Ele afirma que não sabe o que se passa no íntimo de seus personagens, mas ele sabe, só não nos conta... Na minha opinião, aliás, ele é, junto com a miséria, um dos personagens principais da trama.

Logo no início, somos envolvidos pela personalidade do Bispo de Digne, Charles Myriel (D. Bienvenu). O primeiro livro, aliás, é todo dedicado a ele. O narrador não poupa páginas para descrever Charles Myriel e suas ações, sua bondade, suas dúvidas e, sim, sua opinião política. O que nos faz indagar: por que Victor Hugo gastou tantas páginas com um personagem secundário como o bispo? Na minha opinião, existem alguns motivos para tal façanha: 1) para que possamos entender melhor esse personagem e, assim, compreender melhor o motivo de sua ação com Jean Valjean; 2) porque, por mais que ele apareça explicitamente no primeiro e início do segundo livro, desse primeiro tomo, ele estará implicitamente no decorrer de toda história; e 3) como uma forma de criticar o clero.

Charles Myriel é um personagem encantador, sem dúvida. Ele foi nomeado bispo de Digne por ter agradado o imperador Napoleão com apenas uma frase. Sabemos pouca coisa da sua vida antes do clero, apenas que sua família fazia parte da aristocracia parlamentar, que foi casado e que, durante a Revolução Francesa se refugiou na Itália, onde ali sua esposa veio a falecer. Quando retornou para a Franca, sabe-se que já era padre. Em Digne, vivia uma vida simples com sua irmã, a Srta. Baptistine e a criada, Mme. Maglorie.

Sua opinião política é apresentada com muita sutileza pelo narrador, principalmente no diálogo travado com o Sr. G., um homem que foi membro da Convenção Nacional, que governou a França de 1792 a 1795. Sendo condenado pela sociedade, o homem vivia recluso e já estava prestes a morrer quando recebe a visita do bispo. O diálogo travado entre os dois é muito interessante e extremamente polêmico. Depois de lermos essa conversa podemos facilmente imaginar que o bispo fosse contra a Revolução Francesa e contra Napoleão, no entanto, difícil não ser quando toda uma população continuou na mesma miséria de antes e quando as leis continuaram a só prejudicar os mais pobres...

No Livro Dois conhecemos Jean Valjean e a sua história até a saída das Gales. Ele é basicamente o produto da própria sociedade que o despreza e o ignora. Presenciamos, no início desse segundo livro, uma crítica intensa ao sistema penitenciário, que também vale para os dias atuais. Primeiro, pela condenação de Valjean ter sido desproporcional ao crime cometido. Segundo, pela mudança do personagem, a forma como ele entra e a forma que ele sai das Gales, completamente diferente, um outro homem, que só alimenta o ódio dentro si. E, por fim, ao fato de não haver ressocialização daquele ex-presidiário com a sociedade, ao contrário, ele só se sente recriminado e excluído por essa sociedade.

No entanto, o encontro com o bispo irá transformar a vida de Jean Valjean. <3 E vai ser lindo, tenho certeza.

De uma forma geral, achei lenta e arrastada a leitura do primeiro livro, porém, a leitura do segundo livro, quando o Jean Valjean aparece, achei mais fluída. Estou ansiosa pelas próximas páginas!!

Abaixo, compartilho com vocês o Diário de Leitura de outros blogs, que também estão no projeto:


Um pouco mais sobre o processo de criação de Victor Hugo você também encontra aqui.

Um beijo e até mais! ;*

7 comentários:

  1. Nossa, você escreveu uma resenha dos primeiros livros! hehehe que post completo!
    Eu gostei bastante da leitura. Aprendi bastante com o bispo. Sua história é bastante detalhada e, talvez por isso, seja mais lenta. Mas mesmo assim, consegui ler rápido. E o Jean Valjean... ♥ Estou muito ansiosa para saber o que acontece no futuro, pois seu passado me comoveu!

    Boa leitura para nós!

    Beijos,
    Amanda Melanie

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  2. Oii Thalita !!

    Gostei muito do seu post !! Contextualizar a história, visitando o passado para entendermos o presente de Os Miseráveis é indispensável, né ?! Eu fiz isso na minha leitura, esqueci de fazer no post... ahaha !! Ainda bem que você fez aqui !! Adorei mesmo. <3

    O bispo, por mais que seja secundário, ele teve um papel importante demais para o desenrolar da história. É incrível como Victor Hugo não deixa nenhuma ponta solta... Você vai ver !! <3 <3 <3 E, por mais que tenha sido meio demorada a leitura do primeiro livro, isso foi maravilhoso, porque agora, dificilmente a gente vai esquecer esse personagem, né?

    E, muuuuito obrigada por linkar o meu post aqui !! <3 <3 <3 <3 <3

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    Respostas
    1. <3
      Adorei o seu post, claro que iria linkar!
      Estou agora no livro que fala sobre 1817. Muito complicado essa parte, cheia de referências históricas.

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    2. Aaaah !! Verdade, tem muita referência histórica... Eu achei simplesmente genial esse primeiro capítulo do livro sobre 1817 !! Ele joga todos esses momentos e no final ele dá a sua justificativa... E essa justificativa foi sensacional !! Tu vai ver só !! Victor Hugo = Gênio !! <3

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  3. Oi, Thalita.
    Tbm estou participando da leitura e adorei seu post, está bem completo!
    Tô adorando o livro! O cuidado que ele tem em nos apresentar os personagens acho que faz com que entendamos cada atitude que eles têm ao longo da história.
    Tbm acho que o narrador é superimportante na história!
    Tô fazendo um diário de leitura semanal tbm (http://youtube.com/helenacintraeher).
    Bjos!

    http://leitoranaholanda.com.br

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    Respostas
    1. Que legal, Helena! Irei acompanhar também o seu diário de leitura. Um beijo!

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