15/03/2015

"As Vinhas da Ira", de John Steinbeck



Sinopse: O livro representa o confronto entre indivíduo e sociedade, através da epopéia da família Joad, expulsa pela seca dos campos de algodão de Oklahoma, para tentar a sobrevivência como bóias-frias nas plantações de frutas do Vale de Salinas, na Califórnia. Steinbeck retratou a situação do homem moderno diante das dificuldades, a pobreza e a privação em um universo feroz, protagonizado por vítimas da competição e párias sociais. O autor exibe na vida e na arte paradoxos, provocados pela tensão entre instinto e mente, natureza e história, a civilização e seus descontentes. 'As vinhas da ira' é a prova de que homens em lugares e situações comuns podem ser tocados pela intenção épica e conduzidos à imortalidade.

Avaliação: 5/5





"As Vinhas da Ira" é um livro grandioso. Não só por ter se tornado um clássico da literatura mundial, mas, sim, e principalmente, porque ele mexe com nossa alma.

John Steinbeck (1902-1968) - assim como Victor Hugo, em seu livro "Os Miseráveis" - voltou seu olhar na década de 30 àquelas famílias que estavam marginalizadas pela sociedade, como consequência de uma grande crise econômica - que também tornou-se social - que assolou os Estados Unidos da América, no final da década de 20 e toda a década de 30.

Como todos(as) nós estudamos nas aulas de história, a Década de 20 nos Estados Unidos foi considerada a época de um grande crescimento econômico nos país. Após a Primeira Guerra Mundial, o país era a  maior potência econômica do mundo, o consumo aumentou absurdamente e os empresários do setor de produção industrial e os fazendeiros investiram muito em seus negócios a fim de acompanhar o ritmo de consumo no país e no mundo. Aqui vamos nos deter principalmente ao setor agropecuário, visto ser o pano de fundo e início de toda saga contida no livro "As Vinhas da Ira".

Pois bem, com o aumento do consumo, os fazendeiros procuraram os bancos para investir alto nas máquinas de produção e acabaram tornando-se arrendatários das terras. Com a Grande Depressão de 1929 e a Europa se recuperando da Primeira Guerra Mundial, o preço dos insumos colhidos no campo despencaram, uma vez que a demanda se tornou muito menor que a oferta. Os fazendeiros, no início da década de 30, tentam se recuperar dessa crise e pagar aos bancos as suas terras e as suas dívidas. Para isso, os agricultores, com o intuito de aumentar mais sua produção, passaram a plantar antes que o solo fosse tratado adequadamente, provocando, então, o ressecamento da terra.

Tempestade de areia no Texas
As tempestades de poeira, conhecida nos EUA como Dust Bowl (tradução literal: Taça de Pó) foram uma consequência direta dessa produção irregular de insumos no campo, que deixou o solo despojado de umidade, sendo facilmente levantado pelo vento em grandes nuvens de pó e areia que, de tão espessas, impediam até a penetração dos raios de sol. Aconteceu no país nos anos 1934, 1936 e 1939 e desabrigaram muitas famílias de suas terras.

Na época, como as plantações foram arrasadas, os bancos (os "donos das terras") expulsaram os arrendatários e colocavam um só homem com um só trator para cuidar de várias fazendas. No fundo, como os bancos também passavam por uma grande crise devido à Grande Depressão, tal negócio foi extremamente lucrativo para eles. Porém, provocou um desastre social, com a migração de cerca de 300 mil pessoas para o oeste.

Esse foi o pano de fundo e inspiração para que John Steinbeck escrevesse "As Vinhas da Ira". O livro foca especialmente na situação dos trabalhadores do campo que vinham sofrendo desde a Grande Depressão de 1929. Despojados de suas terras, milhares de famílias viajam rumo ao oeste do país, principalmente para a Califórnia, iludidas pela promessa de conseguirem emprego, com boas condições de trabalho e bons salários, e finalmente, reconstruírem um lar em que possam morar.
"Em 1936, Steinbeck lançou Batalha Incerta, livro sobre uma guerra provocada pelo Partido Comunista. Durante a pesquisa, ele entrevistou comunistas, trabalhadores e fazendeiros. Depois da publicação, o jornal San Francisco News procurou Steinbeck para fazer sete reportagens sobre os trabalhadores que migravam para a Califórnia. E ali surgiu a inspiração para Vinhas." (Herb Behrens, arquivista do National Steinbeck Center)
Lançado em março de 1939, "As Vinhas da Ira" foi um sucesso de venda na época, mas também um sucesso de críticas negativas, que despertou uma reação raivosa de setores conservadores da sociedade americana. Steinbeck foi considerado o comunista mais perigoso da costa oeste do país e chegou até a ser investigado pelo FBI. O livro também chegou a ser banido de várias bibliotecas americanas e até hoje continua na lista dos mais proibidos em algumas bibliotecas. Por outro lado, o livro rendeu ao escritor o Prêmio Pulitzer (1940) e uma fama que o fez ganhar o Nobel de Literatura em 1962. Ainda sim, ganhou uma versão para o cinema dirigida por John Ford e que faturou dois Oscar.

Família Joad
O livro foca na família Joad, de Sallisaw, Oklahoma, mas poderia ser qualquer outra família. Despojados de sua terra, a família Joad parte para a Califórnia, atraída por vários folhetos que prometiam trabalho na colheita de frutas no Estado. Ao falar desse livro, eu gosto de dividi-lo em duas partes: 1ª) a travessia da família Joad (e de inúmeras outras famílias) de leste a oeste pela Estrada 66, em um carro pequeno e caindo aos pedaços que acomodava toda a família; 2ª) a chegada na Califórnia e todos os desafios que tiveram que enfrentar.

Na Estrada 66, já observamos que existe uma migração em massa para a Califórnia, uma espécie de fuga desesperada para o Oeste. As famílias viajam em precárias condições, com pouco dinheiro e em carros que vivem dando problemas. No entanto, apesar das poucas condições, vemos também a solidariedade entre pessoas que passam pela mesma situação, como se todos os migrantes se tornassem uma só família.

Estrada 66
Na Califórnia, a Família Joad começa a perceber que a realidade não é como imaginaram. Percebem que foram enganados com falsas promessas, assim como outras milhares de famílias. E, então, começa uma luta por sobrevivência e por trabalho intensa. Nessa parte, começamos a ter a dimensão do tamanho do problema social com a migração em massa para o Oeste e a discriminação e repressão sofrida por esses trabalhadores. É revoltante vermos a situação precária dos acampamentos (Hooverville), o preço das horas de trabalho (e aqui vale a premissa: quanto maior a procura, menores os preços), a repressão da polícia, a "disputa" entre os trabalhadores, as frutas apodrecendo enquanto milhares passam fome, a tecnologia no campo, cavalos sendo tratados de uma forma melhor que as pessoas e a chegada das chuvas intensas. No entanto, mesmo nessa situação, observamos também a solidariedade entre as pessoas, as festas como um meio da busca pelo prazer há tanto tempo perdido e a organização do acampamento do Governo.

Outra observação interessante é a seguinte: aqui temos mais uma confirmação de que, quando o povo é organizado, ele consegue amedrontar as autoridades. A repressão contra os trabalhadores era muito grande, mas ela tinha como motivo principal evitar a mudança do "eu" para o "nós", ou seja, a organização dos trabalhadores. E Steinbeck foi muito feliz ao mostrar a organização como alternativa à exploração.

Outro fato curioso que chamou muito a minha atenção do livro: a narrativa sobre o surgimento da Califórnia, de como esse pedaço de terra passou dos mexicanos para os americanos e como as propriedade tornaram-se grandes e a quantidade de fazendeiros diminuiu.

O final desse livro é um dos mais lindos que já vi, dentre tantos livros que já li na vida. Mostra a que ponto somos capazes de ajudar o próximo. Como se já não bastasse toda a saga da família, suas perdas e conquistas, só pelo final já vale a pena ler sobre tanto sofrimento. Sofrimento esse que tratava a realidade e, por isso, incomodou tantas pessoas na época de seu lançamento.

Steinbeck é fiel à linguagem do homem do campo, à sua simplicidade que encanta e é também muito engraçada (a cena da descoberta do vaso sanitário me fez rir muito!) e ao seu modo de viver, de ver as pessoas e o seu olhar sobre a vida. Em sua narrativa, o escritor intercala um capítulo sobre a vida dos Joad e outro com uma narrativa sobre a situação geral, de todos os migrantes, demonstrando, assim, que o que ocorreu não foi um fato isolado, mas sim uma epopeia dos trabalhadores do campo na época.

Nossa, ainda falaria aqui sobre tantas outras coisas que esse livro me encantou, mas quero terminar com uma metáfora que o autor faz no começo do livro sobre a tartaruga. Aqui ele faz uma apologia à luta diária dos trabalhadores e é sublime!

Enfim, indico muito a leitura desse livro! Depois de lê-lo passei a entender do porquê ele ser um clássico da literatura mundial.

Boa leitura! :*

Observação 01: Uma curiosidade. Quem deu o título ao livro "The Grapes of Wrath" (As Vinhas da Ira) foi a primeira mulher de John Steinbeck, Carol, e esse título é parte do hino abolicionista da Guerra Civil americana.

Observação 02: Quer saber mais sobre a Tempestade Negra ou Dust Bowl? Tem aqui um documentário muito interessante. Vale a pena conferir!

14/03/2015

Três livros de Rubem Alves

Olá pessoas queridas! =]

Resolvi falar, numa postagem só, sobre alguns livros do Rubem Alves que li e que me tocaram profundamente. Rubem Alves tem essa facilidade de conversar com a nossa alma, com o nosso ser e todos os três livros que li e que vou relatar logo abaixo mexeram muito comigo, me fizeram pensar e consegui me identificar muito com os seus pensamentos.

Antes quero falar o seguinte: eu tinha um preconceito imenso com o Rubem Alves! Não sei de onde surgiu isso, eu simplesmente criei esse preconceito da minha cabeça e imaginava que seus livros fossem muito ruins. No entanto, felizmente uma amiga me presenteou com o livro "Perguntaram-me Se Acredito Em Deus" e paguei a língua. Felizmente! (obrigada, Mônica!) No entanto, para minha tristeza, só o "conheci" após a sua morte.

Bom, se você é uma pessoa que tem esse "preconceito" que eu tinha sobre o Rubem ou se você nunca leu uma obra dele, deixe tudo o que você está fazendo agora e leia um livro seu, qualquer que seja! Eu juro, você não vai se arrepender...

Se você quiser conhecer Rubem Alves leia os seus livros. Lá estão a mais pura essência de quem foi (e ainda é) Rubem Alves. Você também pode acessar o seu site que descreve também um pouco sobre ele e seus projetos. Mas quero descrever aqui o que eu acho quem é (foi) esse mineiro.

Rubem Alves "é um fingidor. Finge tão completamente que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente" (Fernando Pessoa). Ele foi poeta, escritor, filósofo, educador, cronista, contador de histórias (e das boas), teólogo, acadêmico, psicanalista e, acima de tudo, um amante das coisas boas e simples da vida e dos ipês amarelos. Ele foi e é, porque o seu legado, as suas ideias, ainda moram - vivas - dentro de nós.

Pois bem, ano passado li "Perguntaram-me Se Acredito Em Deus" e recentemente li mais dois livros "A Grande Arte De Ser Feliz" e "Pimentas", todas da Editora Planeta. Sobre esses livros que passo a falar agora.

# Perguntaram-me Se Acredito Em Deus



Sinopse: "Escrever e ler são rituais mágicos. Num primeiro momento, aquele que escreve transforma a sua carne e o seu sangue em palavras. No momento seguinte, aquele que lê transforma as palavras lidas na sua própria carne e no seu próprio sangue. A isso se dá o nome de antropofagia. O escritor se oferece para ser comido. O leitor lerá o texto se o seu gosto for bom. Se o gosto do texto for bom, ele então o comerá até o fim. Escrever e ler, assim, são um ritual eucarístico: comer carne e beber sangue. O sangue do escritor então irá circular no corpo daquele que o leu.
Os rituais antropofágicos não se faziam por razões gastronômicas. O que se desejava era que as virtudes da vítima fossem transferidas para o corpo daquele que comia.
Esses textos são pedações de mim. Li muitos textos sagrados. Comi aqueles que me deram prazer. Os outros, meu sangue rejeitou.
Agora eu os ofereço como partes de mim mesmo. Se eles lhe derem prazer, você ficará parecido comigo. E experimentaremos aquilo que se dá o nome de comunhão..."



Com um convite desse, impresso na orelha do livro, difícil não ter a curiosidade de saborear "Perguntaram-me Se Acredito Em Deus". Esse livro é alimento para nossa espiritualidade. Nele, Rubem expressa sua forma de ver Deus através do velho mestre Benjamin.

Mestre Benjamin é um contador de histórias de uma aldeia/comunidade e todas as noites as crianças e adultos se reúnem em torno dele na sua tenda para escutar suas histórias sobre o texto sagrado. Todas as perguntas eram respondidas através de histórias, por isso as crianças o adoravam.

O que mais me encantou nesse livro foi a visão de Rubem sobre Deus. Longe de ser aquele Deus-carrasco apresentado pela maioria das Igrejas, para o escritor "Deus é a beleza". Esse livro faz a gente pensar e repensar um bucado de coisas sobre a nossa espiritualidade.

Nota: 5/5

# A Grande Arte de Ser Feliz






Sinopse: Em A Grande Arte de Ser Feliz, Rubem Alves nos presenteia com uma seleção de crônicas tocantes sobre a vida. O autor nos propõe que cada pensamento seja como um novo brinquedo, que nos dê alegria, nos divirta e também faça pensar. Muitas das crônicas foram escritas a partir de dúvidas e sugestões de leitores que acompanham seu trabalho e foram enviadas a ele por meio de cartas, e-mails ou telefonemas. Seu estilo único, profundo e metafórico é desenvolvido em três partes: Coisas que dão alegria, Coisas do amor e Coisas da alma, sendo que cada uma delas apresenta de forma encantadora os sentimentos e situações que todos nós já nos deparamos um dia.








O que me chamou atenção inicial nesse livro foi a capa: que mandala linda! A gente pode ficar horas e horas olhando para ela e refletindo um milhão de coisas... Talvez seja esse o propósito dessa mandala na capa, nos fazer refletir enquanto lemos cada crônica do escritor.

Como bem descrito na sinopse, Rubem Alves selecionou aqui algumas crônicas que possuem como pano de fundo o tema "felicidade" do mais diversos pontos de vista e dividiu o livro em três partes: Coisas Que Dão Alegria (08 crônicas), Coisas do Amor (09 crônicas) e Coisas da Alma (09 crônicas).

Aqui, mais importante do que falar sobre as crônicas, é fazer um convite para você, leitor, ler o livro e se deliciar a cada momento. As crônicas que mais gostei foram: Sem Contabilidade, 'Vossos Filhos São Pássaros...', Sobre Deus e Sobre o Inferno.

Nota: 5/5


# Pimentas

Sinopse: Trata-se de uma compilação de crônicas sobre ideias e pessoas, sobre pensamentos que incendeiam a mente e que levam a outras ideias. Daí o título do livro, conforme explica o autor: “Pimentas são frutinhas coloridas que têm poder para provocar incêndios na boca. Pois há ideias que se assemelham às pimentas: elas podem provocar incêndios nos pensamentos. (…) Mas, para se provocar um incêndio, não é preciso fogo. Basta uma única brasa. Um único pensamento-pimenta…”. Dividido em 74 pequenos contos, reflexões que brotaram na mente sempre criativa do autor, o livro encanta por sua proximidade com a vida cotidiana de pessoas comuns. “Pois qual é o dono de cachorro que nunca olhou para os olhos de seu cãozinho e se perguntou: ‘O que será que ele pensa de mim?’”, indaga Rubem em Sobre gatos. E com a sua tônica espirituosa, prossegue: “Alguém disse que preferia os gatos aos cachorros porque não há gatos policiais”. Religião (histórias sobre São Judas, São Jorge e até sobre o diabo), animais domésticos, noções de etiqueta, comida, gramática, literatura, poesia (o autor é um grande admirador de Fernando Pessoa, Pablo Neruda, Adélia Prato e Manoel de Barros, só para citar quatro grandes poetas), saúde e doença, velhice, sexo, homens e mulheres, ciência, fé e morte. Nada escapa à mente de Rubem Alves, um observador arguto da vida e de seus pequenos momentos, possivelmente insignificantes para um olhar menos atento.


O que aconteceu quando li esse livro: comecei lendo-o, saboreando cada crônica e depois não queria mais parar! Acho que li esse livro em uns dois dias... O que é muito ruim, concordo, mas eu simplesmente não queria mais acabar de ler as crônicas.

Como dito na sinopse, em "Pimentas", Rubem Alves selecionou 74 crônicas que continham reflexões do escritor sobre a vida, sobre a espiritualidade, sobre a morte, etc., e colocou nesse livro que tem como objetivo incendiar a nossa mente.

É um livro divino. Aliás, dos três livros aqui abaixo, se você me pedisse para escolher apenas um deles para ler, provavelmente escolheria "Pimentas". Não que seja melhor que os outros, mas aqui como há mais crônicas, temos uma noção das reflexões do autor sobre os mais variados temas.

Uma crônica que achei interessantíssima foi "Sobre a Função Cultural das Privadas". Nela Rubem fala: "A privada é o lugar onde estamos sós e ninguém tem o direito de nos incomodar. Lugar de refúgio, santuário de solidão. Quando a gente está na privada, não tem de se comportar direito, não tem de prestar atenção ao que os outros estão dizendo. É um lugar de liberdade e honestidade".

Outras crônicas que gostei muito: Dona Clara, Os Ipês Amarelos, Amor de Velhice, Escrevo o Que Não Sou..., Conversa com o Diabo II, "Tudo É Inútil...", A Dor da Morte, Monsieur Verdoux e Ensinando a Tristeza.

E vocês, já leram? O que acharam?

Boa leitura! :*

08/03/2015

"Sejamos Todos Feministas", de Chimamanda Ngozi Adichie

Sinopse: Sejamos todos feministas - O que significa ser feminista no século XXI? Por que o feminismo é essencial para libertar homens e mulheres? Eis as questões que estão no cerne de Sejamos todos feministas, ensaio da premiada autora de Americanah e Meio sol amarelo."A questão de gênero é importante em qualquer canto do mundo. É importante que comecemos a planejar e sonhar um mundo diferente. Um mundo mais justo. Um mundo de homens mais felizes e mulheres mais felizes, mais autênticos consigo mesmos. E é assim que devemos começar: precisamos criar nossas filhas de uma maneira diferente. Também precisamos criar nossos filhos de uma maneira diferente."Chimamanda Ngozi Adichie ainda se lembra exatamente da primeira vez em que a chamaram de feminista. Foi durante uma discussão com seu amigo de infância Okoloma. Não era um elogio. Percebi pelo tom da voz dele; era como se dissesse: Você apoia o terrorismo!. Apesar do tom de desaprovação de Okoloma, Adichie abraçou o termo e em resposta àqueles que lhe diziam que feministas são infelizes porque nunca se casaram, que são anti-africanas, que odeiam homens e maquiagem começou a se intitular uma feminista feliz e africana que não odeia homens, e que gosta de usar batom e salto alto para si mesma, e não para os homens.Neste ensaio agudo, sagaz e revelador, Adichie parte de sua experiência pessoal de mulher e nigeriana para pensar o que ainda precisa ser feito de modo que as meninas não anulem mais sua personalidade para ser como esperam que sejam, e os meninos se sintam livres para crescer sem ter que se enquadrar nos estereótipos de masculinidade. Sejamos todos feministas é uma adaptação do discurso feito pela autora no TEDx Euston, que conta com mais de 1 milhão de visualizações e foi musicado por Beyoncé.

Nota: 5/5

***

Semana passada li o livro da nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, “Sejamos Todos Feministas”, lançado pela Editora Companhia das Letras e distribuído gratuitamente seu e-book pela Livraria Cultura (pessoal, só procurei no site da Livraria Cultura e logo o encontrei de graça, mas provavelmente, outras livrarias também devem disponibilizar o e-book gratuitamente). Para quem não sabe, a Chimamanda é autora de três outros livros que fazem bastante sucesso, principalmente nos Estados Unidos, onde ela já tem um público seleto, quais sejam: "Meio Sol Amarelo" (2008), "Hibisco Roxo" (2011) e "Americanah" (2014).

Fazia um bom tempo que eu não lia nada sobre o feminismo e suas pautas. Aliás, por mais que faça parte ainda de um grupo de mulheres, tenho militado muito pouco em relação a esse tema. Mas, eu sou da opinião de que, quando se trata de feminismo, a nossa batalha é cotidiana, dentro e fora de casa, em nossas relações pessoais e profissionais, enfim, em tudo.

Logo que eu comecei a estudar mais e me aprofundar no tema do “feminismo”, percebi que nele há várias correntes, que vão desde as radicais às mais moderadas, que, na minha humilde opinião, tem muito mais a ver com a forma do que com o conteúdo. Porque o conteúdo é um só: o mundo é machista e precisamos combater esse machismo. Não queremos que as mulheres dominem os homens, mas que elas dominem o mundo junto com os homens, que tenham uma relação equitativa e saudável. No entanto, por falta de conhecimento, homens e mulheres (sim, infelizmente também as mulheres!) nos estereotipam como “aquelas-que-não-gostam-de-homens-e-se-vestem-como-eles”, ou seja, uma imagem totalmente negativa que tenta, acima de tudo, deslegitimar o movimento. Quando, na realidade, o feminismo nada tem a ver com isso...

Bom, descobri o livro da Chimamanda pelo canal no YouTube daTatiana Feltrin. O livro é bem curtinho (demorei quase uma hora para lê-lo por completo) e ele é, na realidade, uma palestra que a escritora proferiu em dezembro de 2012 no TEXsEuston (conferência anual que tem por foco a África). O tema do seu discurso foi o feminismo, porque esse também é um grande problema que assola e mata no continente africano, assim como em todo o resto do mundo.

Decidi falar sobre o feminismo porque é uma questão que me toca especialmente. Suspeitei que não seria um assunto muito popular, mas pensei que poderia começar um diálogo necessário. (...) No fim, a aclamação da plateia, com todos de pé, me deu esperanças.

Na minha opinião, Chimamanda foi muito feliz no tema e em toda a sua fala. Não foi à toa que ela saiu aplaudida de pé por toda a plateia. Com uma simplicidade ímpar, a escritora conseguiu demonstrar que o feminismo não tem nada a ver com aquele teor negativista que nos estereotipam e que ser feminista é ser uma pessoa feliz com a vida, com as pessoas e consigo mesmo. Aliás, feministas também podem usar batom, salto alto, vestir-se bem e ter bom relacionamento com os homens!

Decidi me tornar uma "feminista feliz e africana que não odeia homens, e que gosta de usar batom e salto alto para si mesma, e não para os homens”.

O que se busca não é a dominação do mundo, mas a divisão de tarefas na sociedade e dentro de casa, é a igualdade no mundo do trabalho e nas relações interpessoais .

Adichie nos mostrou a realidade da Nigéria, de como as mulheres são praticamente invisíveis. Tratou também sobre a opinião de seu amigo, que relatou a ela que não entendia “que as coisas são diferentes e mais difíceis para as mulheres. Talvez fosse verdade no passado, mas não é mais. Hoje as mulheres têm tudo o que querem”. Isso me lembrou duas coisas. A primeira, quando participava de grupos de assessoria jurídica universitária popular e estudávamos Paulo Freire, e percebi que só quem podem entender, sentir e lutar pelo preconceito são aqueles e aquelas que sofrem dele diretamente. Dessa forma, percebi que não podemos ajudar o oprimido(a), mas só, e tão somente, ele(a) mesmo(a) pode se ajudar. A segunda, é que há umas semanas atrás, assistindo ao programa “Direito e Literatura”, apresentado por Lenio Streck, que passa todo domingo, na TV Justiça (aliás, recomendo demais esse programa, maravilhoso!), vi que um dos temas era sobre o patriarcalismo e um dos convidados dizia que "sem a modernização capitalista não teria havido a derrocada do patriarcalismo". Peraí, como assim?? Mas, sua argumentação baseava-se no fato de que, com o capitalismo, as mulheres puderam trabalhar. Claro, era um homem falando. E a gente até entende que ele fale assim, porque não é ele que sofre diretamente com todo o preconceito de ser mulher e com a sociedade patriarcal.

O machismo não é normal e nós, mulheres, não devemos considerar que ele seja assim tratado em nossa sociedade. Homens e mulheres são apenas fisicamente diferentes, mas todos têm igual capacidade. Aliás, após a eleição presidencial de Dilma Rousseff, ficou o jargão de que toda mulher pode ser o que ela quiser, o que é a mais plena verdade.

Então, de uma forma literal, os homens governam o mundo. Isso fazia sentido há mil anos. Os seres humanos viviam num mundo onde a força física era o atributo mais importante para a sobrevivência; quanto mais forte a pessoa, mais chances ela tinha de liderar. E os homens, de uma maneira geral, são fisicamente mais fortes. Hoje, vivemos num mundo completamente diferente. A pessoa mais qualificada para liderar não é a pessoa fisicamente mais forte. É a mais inteligente, a mais culta, a mais criativa, a mais inovadora. E não existem hormônios para esses atributos.

Enfim, apesar de simples, como dito anteriormente, adorei o livro da nigeriana Chimamanda. Aliás, para quem nunca leu nenhuma literatura feminista e se interessa pelo tema, eis uma sugestão como pontapé inicial. Cá entre nós, alguns livros “feministas” são tão chatos, que até desanima a nossa leitura... Mas esse aqui, tenho certeza que ninguém irá se arrepender.

Ainda sim, um fato que me chamou atenção foi o título do livro "Sejamos TODOS Feministas". Peraí, foi um erro de tradução ou foi intencional esse título? Daqui, ficamos com a expectativa de que ele tenha sido intencional. ;-)

Por fim, a nossa sociedade e nossa cultura estão em plena transformação. Como disse Chimamanda: “A cultura não faz as pessoas. As pessoas fazem a cultura”. Aliás, vivemos sempre em transformação, mas acho que os ventos desse início de século XXI trouxeram uma mudança de paradigma muito importante para a sociedade brasileira, principalmente após a eleição de Lula, em 2002. Sou da opinião que setores, antes marginalizados porque sofriam com a forte intolerância da nossa sociedade, hoje têm mais espaço para se manifestarem e lutarem por seus direitos. A sociedade aos poucos vai deixando sua intolerância de lado, mas, claro, esse processo é lento e gradual. E o mesmo deve acontecer (e tem acontecido!) com os direitos das mulheres.

Um 08 de março de muita luta, muita reflexão e muita transformação para todas nós!

Falar é fácil, eu sei, mas as mulheres só precisam aprender a dizer NÃO a tudo isso.
O problema da questão de gênero é que ela prescreve como devemos ser em vez de reconhecer como somos. Seríamos bem mais felizes, mais livres para sermos quem realmente somos, se não tivéssemos o peso das expectativas do gênero.
Beijos e boa leitura!


05/03/2015

[Desafio Literário] 100 Livros Essenciais da Literatura Brasileira

Olá pessoas!

Bom, como disse a vocês na última postagem de 2014 (#Projeto50LivrosEmUmAno), no ano passado participei do desafio proposto pelo @caiovsk no Instragran, de ler 50 livros durante um ano. Foi muito legal o desafio, no entanto, como disse na postagem, achei por bem não participar desse tipo de desafio "quantitativo" novamente, uma vez que agora, quero ler livros mais clássicos, maiores e também quero degustá-los, senti-los, apreciá-los. Não que eu não tenha feito isso no ano passado, porém, agora quero que as minhas leituras sigam a “direção do vento”.

Porém, nesse momento, quero propor a mim novos desafios literários, com um teor um pouco diferente do desafio que participei no ano passado e sem tempo de duração, ou seja, desafios para toda a minha vida. Nesse ano, através da linda Thais Godinho (já falei aqui no blog o quanto eu acompanho essa blogueira e o quanto ela serve de inspiração para mim), descobri a Tatiana Feltrin, que possui um canal no YouTube sobre livros e que eu passei a acompanhar. Pois bem, a Tatiana participa de alguns desafios literários que me interessaram e me animaram a tal ponto de querer participar também.

Na realidade, ao total são dois desafios que me interessaram (100 Livros da Literatura Brasileira e 100 Livros da Literatura Mundial), e todos terão uma postagem exclusiva aqui no blog, porém, como disse antes, não terão tempo de duração. Dois desses desafios me inspirei na Tatiana Feltrin e o outro eu mesma criei para mim, através de uma lista de livros publicada pela Revista Bravo.

Então, vamos ao primeiro!

# 100 Livros da Literatura Brasileira:

A Revista Bravo lançou há alguns anos uma lista com os “100 livros essenciais da literatura brasileira”. Infelizmente não tenho a revista e hoje dificilmente ainda encontramos ela (talvez em alguns sebos ainda possamos comprá-la ou no Mercado Livre), mas consegui a lista pela internet.

Após analisar a lista percebi: Gente, o quão pouco eu leio de literatura nacional! Esse quadro vai mudar em breve, claro. Mas, fiquei espantada o quão damos valor para os de fora e pouco para os nacionais...

No meu Instagran (@thalitalindoso) e aqui no blog vocês poderão acompanhar o andamento das minhas leituras. Também estarei usando as hashtag #100LivrosDaLiteraturaBrasileira e #DesafioLiterario para sinalizar os livros que estou lendo ou os que já li.




Eis a relação:


1. Bagagem (Adélia Prado)
2. O Cortiço (Aluísio Azevedo) - lido, mas irei reler!
3. Lira dos Vinte Anos (Álvares de Azevedo)
4. Noite na Taverna (Álvares de Azevedo)
5. Quarup (Antonio Callado)
6. Brás, Bexiga e Barra Funda (Antonio de Alcântara Machado)
7. Romance d’A Pedra do Reino (Ariano Suassuna)
8. Viva Vaia (Augusto de Campos)
9. Eu (Augusto dos Anjos)
10. Ópera dos Mortos (Autran Dourado)
11. O Uruguai (Basílio da Gama)
12. O Tronco (Bernardo Elis)
13. A Escrava Isaura (Bernardo Guimarães) - lido, mas irei reler!
14. Morangos Mofados (Caio Fernando Abreu)
15. A Rosa do Povo (Carlos Drummond de Andrade)
16. Claro Enigma (Carlos Drummond de Andrade)
17. Os Escravos (Castro Alves)
18. Espumas Flutuantes (Castro Alves)
19. Romanceiro da Inconfidência (Cecília Meireles)
20. Mar Absoluto (Cecília Meireles)
21. A Paixão Segundo G.H. (Clarice Lispector)
22. Laços de Família (Clarice Lispector)
23. Broqueis (Cruz e Souza)
24. O Vampiro de Curitiba (Dalton Trevisan)
25. O Pagador de Promessas (Dias Gomes)
26. Os Ratos (Dyonélio Machado)
27. O Tempo e o Vento (Érico Veríssimo)
28. Os Sertões (Euclides da Cunha)
29. O que é Isso, Companheiro? (Fernando Gabeira)
30. O Encontro Marcado (Fernando Sabino)
31. Poema Sujo (Ferreira Gullar)
32. I-Juca Pirama (Gonçalves Dias)
33. Canaã (Graça Aranha)
34. Vidas Secas (Graciliano Ramos)
35. São Bernardo (Graciliano Ramos)
36. Obra Poética (Gregório de Matos)
37. O Grande Sertão: Veredas (Guimarães Rosa)
38. Sagarana (Guimarães Rosa)
39. Galáxias (Haroldo de Campos)
40. A Obscena Senhora D (Hilda Hist)
41. Zero (Ignácio de Louola Brandão)
42. Malagueta, Perus e Bacanaço (João Antônio)
43. Morte e Vida Severina (João Cabral de Melo Neto)
44. A Alma Encantadora das Ruas (João do Rio)
45. Harmada (João Gilberto)
46. Contos Gauchescos (João Simões Lopes Neto)
47. Viva o Povo Brasileiro (João Ubaldo Ribeiro)
48. A Moreninha (Joaquim Manuel de Macedo)
49. Gabriela, Cravo e Canela (Jorge Amado)
50. Terras do Sem Fim (Jorge Amado)
51. Invenção de Orfeu (Jorge de Lima)
52. O Coronel e o Lobisomem (José Cândido de Carvalho)
53. O Guarani (José de Alencar) - lido, mas irei reler!
54. Lucíola (José de Alencar) - lido, mas irei reler!
55. Os Cavalinhos de Platiplanto (J. J. Veiga)
56. Fogo Morto (José Lins do Rego)
57. Triste Fim de Policarpo Quaresma (Lima Barreto) - lido, mas irei reler!
58. Crônica da Casa Assassinada (Lúcio Cardoso)
59. O Analista de Bagé (Luis Fernando Veríssimo)
60. Tremor de Terra (Luiz Vilela)
61. As Meninas (Lygia Fagundes Telles)
62. Seminário dos Ratos (Lygia Fagundes Telles)
63. Memórias Póstumas de Brás Cubas (Machado de Assis) - lido, mas irei reler!
64. Dom Casmurro (Machado de Assis) - lido, mas irei reler!
65. Memórias de um Sargento de Milícias (Manuel Antônio de Almeida) - lido, mas irei reler!
66. Libertinagem (Manuel Bandeira)
67. Estrela da Manhã (Manuel Bandeira)
68. Galvez, Imperador do Acre (Márcio Souza)
69. Macunaíma (Mário de Andrade)
70. Paulicéia Desvairada (Mário de Andrade)
71. O Homem e Sua Hora (Mário Faustino)
72. Nova Antologia Poética (Mário Quintana)
73. A Estrela Sobe (Marques Rebelo)
74. Juca Mulato (Menotti Del Picchia)
75. O Sítio do Pica-pau Amarelo (Monteiro Lobato)
76. As Metamorfoses (Murilo Mendes)
77. O Ex-mágico (Murilo Rubião)
78. Vestido de Noiva (Nelson Rodrigues)
79. A Vida Como Ela É (Nelson Rodrigues)
80. Poesias (Olavo Bilac)
81. Avalovara (Osman Lins)
82. Serafim Ponte Grande (Oswald de Andrade)
83. Memórias Sentimentais de João Miramar (Oswald de Andrade)
84. O Braço Direito (Otto Lara Resende)
85. Sermões (Padre Antônio Vieira)
86. Catatau (Paulo Leminski)
87. Baú de Ossos (Pedro Nava)
88. Navalha de Carne (Plínio Marcos)
89. O Quinze (Rachel de Queiroz)
90. Lavoura Arcaica (Raduan Nassar)
91. Um Copo de Cólera (Raduan Nassar)
92. O Ateneu (Raul Pompéia)
93. 200 Crônicas Escolhidas (Rubem Braga)
94. A Coleira do Cão (Rubem Fonseca)
95. A Senhorita Simpson (Sérgio Sant’Anna)
96. Febeapá (Stanislaw Ponte Preta)
97. Marília de Dirceu (Tomás Antônio Gonzaga)
98. Cartas Chilenas (Tomás Antônio Gonzaga)
99. Nova Antologia Poética (Vinícius de Moraes)
100. Inocência (Visconde de Taunay)

Como vocês podem ver, li muito poucos livros e todos no período do ensino médio, motivo pelo qual irei lê-los novamente.

E vocês, topam o desafio também?

Beijos e boa leitura!
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